domingo, 10 de junho de 2018

Morre uma professora...


O seguinte relato é descrito por uma professora no facebook (manteremos, por ética, ao anonimato), é um relato dentre muitos docentes que a muitos anos tem sofrido com as constantes desestímulos na educação, desde governos corruptos até mesmo dos próprios familiares.

"Entrei na graduação em História visando mudar para Jornalismo. Em meados do 1° período me apaixonei pelo curso. Desisti da ideia de mudar de faculdade. No 3° período me apaixonei de novo, agora pela docência. Uma paixão que foi se consolidando o resto da graduação.

Fui trabalhar numa escola X dentre as quatro instituições que já trabalhei. Me dediquei com tudo que aprendi nas aulas da faculdade. Eram maquetes, análise de fontes, debates e etc. Trabalhei com os mais variados tipos de materiais. Filmes, fotografias, desenhos animados, HQs e muitos outros. Cheguei a pagar alguns materiais do meu bolso como canetas de quadro, cartolinas e Xerox.
A escola começou a atrasar os salários. Cheguei a passar 2 semanas implorando por um vale de 50 reais. Minha dispensa esvaziou, meu nome "sujou".

A diretoria sumiu por mais de um mês. Nenhuma satisfação. Quando reapareceram, alegaram falta de dinheiro. As desculpas vieram acompanhadas de ameaças sutis.

"Se vocês entrarem na justiça, não vão receber nada." Ouvi em uma reunião com outros professores.

Eu não podia abandonar as turmas, tinha começado um projeto e os alunos me davam retorno, as notas eram ótimas. Profissionalmente eu estava muito realizada. Mas, o desespero foi aumentando e as noites de insônia começaram a ser frequentes.

Três meses sem salário. Não suportei e pedi demissão. Me despedi das turmas em meio a alunos chorosos enquanto eu mesma segurava o choro. Comuniquei minha decisão a direção e ouvi um “Tudo bem, colocaremos outro professor no seu lugar” enquanto uma pilha de currículos era folheada na minha frente.

Em outras palavras “Você e seu trabalho são descartáveis”. Mesmo assim, minha ética falou mais alto e deixei tudo impecável. Diários devidamente preenchidos, notas devidamente lançadas. Nada pendente. Passei o mês seguinte ligando e indo a escola pra cobrar meus salários. Pararam de me atender e me receber.

Entrei com um processo trabalhista. Na audiência eles apresentaram um RECIBO DE PAGAMENTO FALSO COM MINHA ASSINATURA. Eu nunca recebi aquele valor, nunca assinei aquele recibo. Falei isso durante a audiência.
Saiu a sentença. O recibo falso foi aceito e minha causa foi dada como improcedente.

Perdi três meses de trabalho e a minha dignidade profissional.

É isso gente. Não existe diálogo entre trabalhador e patrão. Não existe justiça pra classe assalariada. Não existe mais nada além da incerteza da justiça.

Professor tem vida pessoal, gente. Professor paga contas. Professor come. Professor trabalha fora de sala preparando a aula do dia seguinte. Salário não é um favor. É o dever do empregador para com o empregado.

Não volto mais às salas de aula. Me recuso a passar por essa humilhação de novo.

Hoje eu me sepultei profissionalmente e estou enfrentando o luto.
Hoje morreu uma professora.

PS.: Ainda tenho que pagar os honorários do advogado da escola.
Porcaria de reforma trabalhista."

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